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Pessimismo cauteloso e cautela pessimista



Análise sobre os primeiros 100 dias do governo Bolsonaro


Após pouco mais de cem dias do governo Bolsonaro brasileiros e brasileiras estão cautelosos ao avaliar o desempenho do novo chefe do Executivo. Em geral as pessoas acreditam que até agora o governo está sendo pior do que esperavam. Ao mesmo tempo parecem ter ainda alguma esperança (talvez mais torcida que esperança) de que a situação do país melhore daqui pra frente.


É o que revela pesquisa realizada pelo IPE em parceria com a ABRIG(Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais). O levantamento foi realizado entre os dias 6 e 8 de abril. Foram 2.000 entrevistas em 238 cidades brasileiras. A margem de erro é de 2,2p.p para resultados do total da amostra.

Avaliação do governo

O resultado da pesquisa ABRIG-IPE de abril segue a mesma tendência das demais pesquisas divulgadas recentemente (Datafolha e XP/Ipespe). Apesar das críticas diárias na imprensa e constantes "gafes" do Executivo, 32% das pessoas entrevistadas avaliam o governo como ótimo ou bom. Número quase similar avalia o governo como regular e um pouco mais de um quarto dos brasileiros acha que até agora Bolsonaro vem fazendo um governo ruim ou péssimo.


Em uma análise isolada, sem levar em consideração outros fatores, os números de avaliação do governo não são tão ruins quanto a imprensa geral (entendida de maneira ampla) divulgou nos últimos dias. Michel Temer, por exemplo terminou seu governo com apenas 12% de ótimo/bom e 61% de ruim/péssimo (pesquisa ABRIG-IPE de dezembro de 2018).


Mas o contexto importa. Bolsonaro é presidente fazem apenas três meses. Temer foi presidente por pouco mais de dois anos e após um desgastante processo de impeachment de Dilma Rousseff.


Em comparação com o que se esperava de Bolsonaro antes do início do mandato, os números revelam uma decepção dos eleitores em relação ao desempenho do Presidente. Em dezembro, na mesma pesquisa ABRIG-IPE citada acima, 56% dos entrevistados esperavam que o governo fosse ótimo ou bom. É uma diferença significativa para os 32% que avaliam o governo positivamente agora.


O descompasso entre as expectativas antes do início do governo e a realidade de governar apontam para um clima de pessimismo, ao menos no quadro atual. Entretanto o mandato do presidente dura quatro anos, tempo suficiente para reverter o quadro e melhorar o desempenho em termos de avaliação. Por isso as pessoas ainda revelam certa cautela ao analisar o governo Bolsonaro.


Analisando os recortes demográficos da pesquisa, percebemos que existem diferenças claras de avaliação do governo nos diferentes grupos que compõe a sociedade.


Mulheres tendem a avaliar o governo de maneira menos positiva. Os mais jovens apresentam uma visão mais positiva e otimista em relação ao governo Bolsonaro. Entre pessoas com ensino superior, a avaliação positiva do governo alcança 40%. Já o recorte geográfico revela que é no Nordeste onde Bolsonaro apresenta seus piores índices de avaliação, e no Centro-Oeste onde o presidente é melhor avaliado.


Avaliação x Aprovação


As duas palavras podem parecer sinônimos, mas não são. Ao menos no contexto de pesquisas de opinião. Quando se pede para uma pessoa avaliar um governo geralmente os institutos de pesquisa apresentam uma série de opções, ou uma escala. No nosso caso as opções foram ótimo, bom, regular, ruim e péssimo. Isso dá espaço para alguma sutileza de análise dos entrevistados e entrevistadas.


Quando perguntamos sobre a aprovação de um governo, a opção é binária. Ou a pessoa aprova, ou desaprova um governo. A escolha é intencional e o intuito é forçar o entrevistado a escolher um lado.

Em ambientes polarizados, como é a política brasileira (e quase toda democracia atualmente) a comparação entre avaliação e aprovação de um governo pode trazer insights significativos para a análise da opinião pública.

A pergunta sobre a aprovação do governo Bolsonaro revela que uma maioria dos entrevistados ainda aprova o desempenho do atual presidente após esses pouco mais de cem dias de governo. 47% de aprovação popular é um número quase que similar a aprovação de Donald Trump nos Estados Unidos.

Não é um índice ideal, porque não chega perto ainda de uma maioria consolidada da população, mas também não é um número desesperador. Em dezembro, Michel Temer apresentou apenas 15% de aprovação e 73% de desaprovação.


A diferença entre os 32% de avaliação positiva e 47% de aprovação se dá porque na segunda pergunta nós conseguimos avaliar como se distribui a opinião das pessoas que avaliam o governo como regular. Basta analisar a tabela abaixo:


Em resumo, a pesquisa revela que as pessoas em geral esperavam mais do governo Bolsonaro, então existe sim um certo clima de pessimismo. Porém boa parte de brasileiros e brasileiras parece acreditar que ainda é cedo para fazer um veredito definitivo e o presidente ainda tem tempo para corrigir os rumos.


Operação Lava Jato


A pesquisa ABRIG-IPE também avaliou outras questões pontuais do contexto político brasileiro. Este ano a operação Lava Jato está completando 5 anos e os números revelam que mesmo após certo desgaste e ataques contra a atuação de juízes, procuradores e policiais a Lava Jato ainda goza de amplo apoio popular. Quase três quartos dos entrevistados aprovam os resultados da operação até agora.

Na análise dos recortes demográficos é possível ver que todos os grupos apoiam a Lava Jato. O destaque especial é para as pessoas com ensino superior, onde a aprovação da operação chega a quase 80%.


Congresso Nacional e Poder Judiciário


A pesquisa ABRIG-IPE também avaliou a imagem das outras instituições da República, o Congresso Nacional e o Judiciário. As avaliações são contrastantes e chama atenção a aparente deterioração da imagem do Judiciário junto a opinião pública brasileira.

A imagem do Judiciário está pior do que a do Congresso Nacional, historicamente a instituição mais mal avaliada. A imagem do judiciário também piorou em relação ao levantamento feito em dezembro. Já o Congresso conseguiu melhorar sua imagem em relação a dezembro.


As diferenças são pequenas, mas é possível especular sobre algumas causas para esses números. O Congresso, e em especial o presidente da Câmara, Rodrigo Maia apareceu nos últimos meses como o "adulto na sala", rebatendo falas do presidente Bolsonaro e tentando achar maneiras de governar em meio a desorganização do Executivo.


A recente renovação recorde no Congresso também pode ser causa da melhora de imagem, figuras novas podem estar dando um ar de renovação no imaginário de entrevistados e entrevistadas.

Quanto ao Judiciário, a profunda divisão e constantes embates no STF parecem estar causando esses desgaste de imagem. A repercussão de processos como o impeachment e a Lava Jato também parece trabalhar contra a imagem da Justiça no Brasil.


Conclusões


É cedo para qualquer veredito definitivo sobre o governo Bolsonaro. Os sinais até agora foram ruins e há sim um perceptível desgaste na imagem do governo. O desempenho do presidente está significativamente abaixo das expectativas do eleitorado em geral. É um quadro de pessimismo.


Mas também de cautela. Cem dias é pouco para um mandato de quatro anos. As pessoas entrevistadas na pesquisa parecem sentir isso e estão dando algum desconto ao presidente devido ao pouco tempo. A maioria ainda aprova o desempenho de Bolsonaro. E, mais importante, parece haver ainda uma torcida para que o governo dê certo, não por razões partidárias ou ideológicas, mas porque é do interesse de todos que a situação do Brasil melhore.


O quadro então é de um pessimismo cauteloso. Há tempo para corrigir os rumos, mas essa janela de oportunidade está fechando e fica menor a cada dia.


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